17 jul, 2018

Entrevista com sommelier (parte 1): Dicas para acertar no uso e na compra do azeite

Paulo Freitas já degustou centenas de azeites de todo o mundo. Estudioso do assunto há mais de dez anos, quando o Brasil ainda engatinhava no plantio de oliveiras, Paulo tem duas certificações de degustador profissional por instituições italianas e uma certificação em Curso Avançado de Olivicultura e Azeite por uma instituição portuguesa, além de formação em engenharia de alimentos e passagem por empresas do ramo alimentício como executivo. Atualmente, ele se dedica a workshops sobre azeite, palestras, consultorias e degustações.

Durante o evento de lançamento do azeite extravirgem Olibi da safra 2018, realizado no restaurante Nambu Cozinha de Raiz no mês passado, Paulo esteve presente para compartilhar dicas e orientar a degustação. Aproveitamos esse encontro para entrevistá-lo sobre alguns temas interessantes, como o que significa a baixa acidez do óleo da azeitona e qual é a recomendação sobre guardar o produto na geladeira.

Na semana que vem, divulgaremos a segunda parte da entrevista, com dicas de degustação e harmonização com azeite. Aguardem!

Entrevista com o sommelier de azeites, Paulo Freitas – Parte 1

Estamos sempre buscando azeites com baixa acidez. Mas, afinal, o que o percentual de acidez representa para o azeite?

Paulo Freitas: A baixa acidez é um termômetro de que o processo foi feito com qualidade do ponto de vista técnico. Inclusive, destaco que esse percentual vem baixando ao longo dos anos – um sinal de que os processos estão cada vez mais modernos e os produtores têm mais cuidado desde a colheita no campo até a extração e o envasamento.

Um azeite mal feito apresenta uma maior quebra dos ácidos graxos livres (ácido oleico) da estrutura da gordura. Mas isso não tem gosto de nada. A acidez baixa não é uma garantia de que o azeite será agradável do ponto de vista de sabor e aroma. E é impossível perceber essa característica na boca. Apenas uma análise de laboratório poderá mostrar a quantidade de ácido graxo oleico que se soltou da gordura.

É por isso que muitas pessoas se frustram ao comprar um azeite apenas com base no critério da acidez. Já ouvi alguns consumidores dizerem: “comprei um azeite grego com 0,1% de acidez, mas achei praticamente sem sabor e aroma.” O produtor pode ter usado uma azeitona muito suave ou muito madura. Assim, apesar de ser um azeite bem feito, tem pouco sabor.

Então qual é a dica para escolher um bom azeite entre as tantas opções disponíveis?

Paulo Freitas: Muitas informações importantes estão na parte de trás do rótulo. O primeiro passo é olhar a data de envase. Quanto mais jovem, melhor, pois com o passar do tempo todos os azeites têm a intensidade dos seus atributos sensoriais naturalmente reduzidos. Outra questão é verificar se o produto foi produzido e envasado no mesmo lugar. Se o rótulo diz que o azeite foi apenas envasado na Itália, por exemplo, provavelmente ele foi feito de azeitonas da Espanha, Tunísia, Marrocos ou outro país produtor. Isso pode induzir o consumidor a acreditar que ele está consumindo um produto de uma determinada nacionalidade, quando na verdade não está. Isso não é fraude, tampouco indica que é ruim. Ou pararíamos de comer chocolate belga – afinal, não tem plantação de cacau por lá!

Por outro lado, se o azeite for produzido e envasado no mesmo lugar, isso indica que a colheita, a extração e o envase aconteceram em um mesmo país, minimizando o risco de eventuais adulterações por mistura de outros óleos vegetais, que não azeite de oliva. Garrafas escuras ou latas também são melhores, pois protegem o azeite de possíveis alterações ao longo do tempo. Uma embalagem transparente permite a entrada da luminosidade, o que acelera o envelhecimento do azeite. A garrafa transparente pode ser linda, mas o azeite está sendo degradado ali dentro. Por isso, recomenda-se que garrafas transparentes fiquem dentro de uma caixa que as proteja dos efeitos da luz.

Podemos usar o azeite para cozinhar? Ou nesse caso o óleo vegetal é mais indicado?

Paulo Freitas: Dizer que o azeite não aguenta a fritura ou o cozimento é um mito enorme. Coitado dos gregos e espanhóis, que fazem tudo com azeite, não é? Do ponto de vista de saúde e de sabor, o azeite é totalmente vantajoso. Você incorpora sabor e uma gordura saudável ao prato. Ao cozinhar arroz com azeite, o sabor é totalmente diferente daquele preparado com óleo de soja.

Outro mito é o de que o azeite aquecido produz substâncias tóxicas. A única recomendação é evitar que a temperatura se eleve acima de 190°C , que é quando praticamente todos os óleos vegetais começam a produzir fumaça (chamado de “ponto de fumaça”). Acima desta temperatura, o azeite, e todos os demais óleos vegetais, começam a se alterar e produzir substâncias de aroma e sabor desagradáveis. Como a temperatura para uma fritura adequada é entre 160°C e 170°C, o azeite não apresenta nenhuma restrição de uso, pois o seu “ponto de fumaça” situa-se entre 190°C e 210°C.

Me perguntam muito qual é o melhor azeite para fritura. Sempre digo que são os mais suaves possíveis: menos amargo, menos picância e menos frutado. Do contrário, seria como pegar um vinho espetacular para cozinhar um pato. Você perde muito do que o vinho poderia oferecer. A mesma coisa vale para o azeite.

Podemos guardar o azeite na geladeira? Qual é a melhor forma para conservar?

Paulo Freitas: Pode, mas não é necessário. Como o azeite é uma gordura, uma parte formará uma pequena zona cristalizada. Inclusive, há quem erroneamente diga que existe o “teste da geladeira”: se não congelar, é um azeite fraudado. Mas não existe necessidade de colocar na geladeira, uma vez que essa prática não conservará o azeite por mais tempo.

O ideal é guardar o azeite em um lugar escuro, como um armário, longe de fonte de calor. Nunca deixe a garrafa do lado do fogão ou em cima da janela. O calor e a luminosidade alteram o azeite. E um detalhe importante: o ideal é consumir o azeite em até 3 meses depois de aberto.

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Nelio Weiss

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